... sonhei...
... o Sol saudou-me ...
... sentei-me na Esplanada da Brasileira, em pleno Chiado, depois de ter pedido licença ...
... Fernando, já lá estava. Num pequeno papel, desenhava letras ...
... Pedi-lhe autorização para ler ... Fernando não era muito simpático, mas acedeu ...
... Peguei naquele pequeno papel, e li...
... "sonhei-me" sentado ao lado de Fernando Pessoa, tendo sido o primeiro dos mortais a ler estas palavras...
... "sonhei-me" a ler as palavras abaixo reproduzidas ...
... tudo isto sonhei hoje de manhã, num dia 21 de Março, DIA MUNDIAL DA POESIA ...
Horizonte
O mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
'Splendia sobre sobre as naus da iniciação.
Linha severa da longínqua costa
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves, flores,
Onde era só, de longe a abstracta linha.
O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esp'rança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte
Os beijos merecidos da Verdade.
(Fernando Pessoa)
(Fotografia de FAIRES)